terça-feira, 27 de outubro de 2009

A versão oficial e trechos de video

5 de Maio, 1925: um jovem professor no liceu de Dayton, Tennessee, recebe um mandado de captura. É o início de um dos mais célebres casos de tribunal da história Americana. O professor John Thomas Scopes não chegou a passar nenhuma noite preso, a sua fiança de 1000 dólares foi imediatamente paga pela organização que havia colocado no jornal “Chattanooga Times” um anúncio em busca de alguém disposto a violar a lei.




Clarence Darrow (esquerda) e William Jennings Bryan.

Alguns meses antes, um fazendeiro local, John Washington Butler, ficou escandalizado com relatos sobre meninas e meninos que supostamente estariam contestando a veracidade literal da Bíblia, chegando mesmo a responder aos pais. A culpa seria da nova e perigosa teoria da Evolução das Espécies, parte do currículo de Biologia. Além de lavrador, Butler era membro da Assembleia Legislativa do seu estado, e sua indignação encontrou expressão legal. O resultado foi a Lei Estadual #185, conhecida como Ato Butler, aprovada por larga maioria e ratificado a contragosto pelo Governador:

“Um ato proibindo o ensino da Teoria da Evolução em todas as Universidades, Escolas Normais e todas as outras escolas públicas do Tennessee (…) Secção 1: (…), Que será ilegal que qualquer professor em qualquer das Universidades, Escolas Normais e todas as outras escolas públicas do Estado (…) ensine qualquer teoria que negue a história da Criação Divina do homem ensinada na Bíblia (…)”

A reação foi imediata: a aprovação do Ato Butler foi votada a 21 de Março de 1925, e já a 4 de Maio a União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU) publica no “Chattanooga Times” um anúncio em que se dispõe a pagar os custos legais de um professor do estado que se voluntariasse a violar a lei.

A pequena cidade de Dayton passava por tempos difíceis - a principal empresa local, a companhia de minérios Dayton Coal and Iron, faliu em 1913, e muitos abandonaram a cidade em busca de oportunidades, reduzindo a população de 3.000 para 1.800 habitantes, em menos de cinco anos.

O grupo que se reunia regularmente na Drogaria Robinson viu na controvérsia uma oportunidade de reavivar Dayton atraindo a atenção nacional. John T. Scopes, professor de matemática e treinador da equipa de football americano do Liceu do condado foi convencido a confessar ter violado a lei. A ordem de prisão foi prontamente emitida e o grupo da Drogaria teve mais êxito do que poderia ter sonhado.


A acusação foi confiada a William Jennings Bryan, Secretário de Estado (Ministro dos Negócios Estrangeiros) de Woodrow Wilson, candidato três vezes derrotado à Presidência dos Estados Unidos pelo partido Democrata e militante cristão; Bryan via no ensino da Evolução as sementes da decadência moral da nação. Para defender Scopes, a ACLU contratou Clarence Darrow, o mais célebre advogado de defesa do país.

O caso, que ficou conhecido nos Estados Unidos como “O Julgamento do Macaco”, mexeu com a opinião pública e transformou a cidade num circo. Literalmente. À certa altura, segundo relatos da época, foram levados macacos para a porta do tribunal. Também foi o primeiro transmitido ao vivo por rádio no país.

A primeira sessão foi assistida por 1.300 pessoas, 300 delas em pé. De um lado, Bryan, líder da cruzada que banira o evolucionismo das salas de aula em 16 estados até aquele ano. Do outro, Clarence Darrow, que quase foi rejeitado pela União Americana para Liberdades Civis por ser agnóstico. Temia-se que radicalizasse no ataque à religião durante a defesa, o que colocaria a opinião pública dos Estados Unidos irremediavelmente contra Scopes.

O julgamento foi curto, afinal a culpa de Scopes nunca esteve em questão - ele violara a lei de propósito. No seu momento mais dramático, Clarence Darrow chamou como testemunha o seu oponente Bryan - na qualidade de testemunha especialista sobre a Bíblia, uma vez que suas testemunhas, renomados especialistas em ciências, não foram aceitas pela corte.

Confira um trecho do filme "O vento será sua herança", de 1963, com Spencer Tracy no papel do advogado de defesa:




Como era inevitável, Scopes foi condenado a pagar a multa (também paga pela ACLU). A esperança de levar o caso até o Supremo Tribunal para debater a sua constitucionalidade foi entretanto frustrada, quando o Tennessee reverteu a pena, mas apenas por um detalhe técnico. O Ato Butler perdurou como lei até 1967.


2 comentários:

  1. Por que será que o medo da verdade científica é tão forte ainda? Esse medo está tentando esconder alguma coisa que não deve ser identificada pela maioria dos componentes da sociedade comum?

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  2. "Uma lei iníqua quando aplicada, tal qual a cólera, destrói quem a toca, quem a aplica e quem a desafia"

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